Texto de Tatiana Sakurai e Maria Cecília Loschiavo dos Santos
A urgência da discussão e da formulação de propostas concretas diante da incompatibilidade do atual sistema econômico e da preservação do planeta requer um olhar atento a nosso modo de vida.
Não se trata mais apenas de respeitar as gerações futuras, garantindo o mesmo usufruto dos bens materiais e naturais a que tivemos direito, mas de uma busca de novos modelos de ação e pensamento. Teríamos já uma inversão curiosa de valores, ao mudarmos o foco: e se o grau de desenvolvimento dos países fosse medido não pelo índice de industrialização e o PIB mas sim pela produção de resíduos sólidos, poluição e consumo de energia? O arquiteto Bernard Rudofsky nos sugeriu que se os nossos olhos fossem abertos um pouco mais do que estamos acostumados e pudéssemos ser estimulados a observar sem preconceitos étnicos, olharíamos o nosso próprio ambiente com uma maior consciência.
Considerando a realidade brasileira, o antropólogo Darcy Ribeiro, definiu que a abertura de nossos horizontes só acontecerá: “quando proibirmos o passado e o presente de forjarem o futuro que corresponde ao seu ser e à sua propensão. Só realizaremos nossas próprias potencialidades projetando nós mesmos o futuro que queremos para nós. Isso só sucederá quando desenvolvermos estilos de vida e modos de consumo que não se regem pelo primado do lucro, mas que queiram fundamentalmente atender às necessidades de nossa população.”
O design desempenha um papel relevante para promover essa mudança, sobretudo quando consideramos que ele trata da satisfação das necessidades do corpo e do espírito. Neste sentido, a pergunta não é o que ainda deve ser desenhado ou redesenhado, mas o que nos falta?
Em experiências acadêmicas e práticas pedagógicas, envolvendo alunos da área de Design com um contexto local de pobreza e exclusão, os problemas e questões que afloram nos revelam que muito ainda temos a realizar. Um dos primeiros aspectos é a inserção de populações excluídas ou marginalizadas num patamar de equidade social e de visibilidade. Em muitos casos, a própria noção de comunidade precisa ser repensada, pois sua ocupação territorial muitas vezes não registra traços de memória, pertencimento e voz. O “eu” pouco existe. O “nós” é desconhecido.
Falar no planeta sustentável requer a existência de um coletivo de fato, marcado por ações continuadas, pelo envolvimento das organizações civis e governamentais, sem o peso do assistencialismo ou da indiferença. Há um legado histórico e amplo debate crítico na obra de Victor Papanek, Alain Findeli, Bernard Rudofsky, entre outros que indicam a inserção crucial do design na construção desse futuro comum. Esse é o anseio de muitos de nós, estudantes de design espalhados mundo afora.
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Tatiana Sakurai é doutoranda pela Universidade de São Paulo e orientanda da Profa. Maria Cecília Loschiavo dos Santos. Sua pesquisa intitulada “Design de mobiliário doméstico para a experiência” investiga o uso do Experience Design como ferramenta projetual em um contexto de minimização dos impactos ambientais, no para o Brasil e maior alcance social.
“If I can open your eyes a little wider than their accustomed aperture; If I can make you observe without ethnic bias … you will look at your own environment with a more critical awareness”. In: The Getty Research Institute (2006). Lessons from Bernard Rudovsky, Life as a Voyage. Basel.
Ribeiro, Darcy (1983). Apresentação. In: Bonsiepe, Gui. A “tecnologia” da tecnologia. São Paulo. Edgard Blücher.
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Fotos: Experiência coordenada pela Profa. Maria Cecília Loschiavo dos Santos com estudantes de arquitetura e design da Universidade de São Paulo, Brasil. Local: Coopamare - Cooperativa de Catadores Autônomos de Papel, Papelão, Aparas e Materiais Reaproveitáveis– São Paulo – SP, 2008.