O texto que se segue foi-me enviado pelo Francisco Providência numa tentativade traçar um enquadramento do projecto a candidatar à FCT
(Vasco Branco)
Contexto de partida: admitindo que grande parte dos equipamentos e ambientes contemporâneos estão preparados para uma certa padronização de utentes (adultos com toda a capacidade de autonomia motora e intelectual), parece necessária a criação de meios técnicos para responder às Pessoas com necessidades especiais, como os cidadãos infantis, da terceira idade e outras pessoas com doenças do foro neuromotor, perda súbita ou progressiva de memória ou outras manifestações degenerativas ligas à perda de autonomia de locomoção.
Objectivo: responder às pessoas cujas necessidades especiais as tornam um grupo social discriminado, pela padronização moderna e universal das estruturas urbanas modeladas pelo cidadão adulto produtivo.
Metodologia: a resposta a estes cidadãos pode ser de três tipos:
Ambiental, quando se alteram as condições de vida e acesso das pessoas, pelas transformações nos equipamentos que nos rodeiam ‹ por exemplo substituição de escadas por rampas, utilização simultânea de sinalização visual, auditiva e sensitiva, aumento da dimensão e contraste de letreiros, colocação de guardas de segurança e corrimãos, etc;
Instrumental, sempre que se trata da aquisição de equipamentos individuais de uso, contribuintes para um melhor desempenho dos indivíduos através da sua orientação, autonomia de deslocação, autonomia de alimentação e sobrevivência doméstica ‹ por exemplo todo o tipo de bengalas, muletas, cadeiras de rodas, andarilhos, mas também óculos ou talheres especiais;
Protésica, quando a instrumentalidade e eficácia dos artefactos depende da sua fusão com o corpo necessitado, assim constituindo exemplo de simbiose na relação homem-máquina, como solução limite de resposta à precariedade da sobrevivência natural ‹ por exemplo todo o tipo de dispositivos cirúrgicos como estimuladores electro-cardíacos, válvulas arteriais, cabeças de fémur em platina, próteses dentárias em cerâmica, etc.;
Se as intervenções de tipo ambiental se processam sobretudo ao nível da escala da cidade, correspondendo necessariamente à prática de arquitectos, urbanistas, engenheiros de trânsito, paisagistas e designers de equipamento urbano, as de tipo instrumental correspondem claramente à prática tradicional do design industrial ou de equipamento, distanciando-se das terceiras de tipo Protésico, que pela sua natureza limite têm um desenho exclusivamente limitado pela funcionalidade orgânica do corpo do utente (por exemplo no caso das próteses dentárias o desenho é produzido por decalque directo do órgão a ajudar.
Entende-se por objecto deste estudo e em exclusivo, os dispositivos de ajuda técnica de tipo instrumental e consequentemente aqueles que visam uma utilização individual e exterior dos artefactos, estabelecendo com eles uma relação de uso que poderá ser de identidade e pertença. São por isso objectos de ajuda exteriores ao corpo que, por isso, poderão estigmatizar socialmente os seus utentes na medida em que evidenciam a percepção do estado da sua dependência em consequência de doença, envelhecimento, má formação de nascença ou outra forma de incapacitação dos indivíduos.
Esta será porventura a máxima pertinência do Design enquanto disciplina, já que se aspira a um desenho que supere pela comunicação e retórica, os estigmas simbólicos atribuídos a este tipo de artefactos.
Pretende-se igualmente que o desenho destes novos equipamentos de ajuda técnica, incorporam maximamente alta tecnologia de apoio, dotando-os de novos e melhores desempenhos, assim constituindo mais valor de diferenciação pela inovação.
A enorme dimensão da área de intervenção, obrigará a que a selecção e endereçamento de projectos seja objecto de estudo e decisão apoiada em estudos médicos actualizados sobre as principais carências ditadas pela saúde pública ‹ nomeadamente através dos relatórios nacionais de saúde‹, onde se deverá deduzir as áreas de maior necessidade, ou de resposta carenciada pelo mercado.
Não se tratará portanto de desenhar apenas mais uma cadeira de rodas, mas antes de investigar o processo da sua evolução tendo em conta os seus pressupostos ergonómicos, simbólicos, estéticos e funcionais. A totalidade da investigação deverá encontrar no estudo dos meios de construção, uma resposta que a partir de novos materiais, possa constituir uma alternativa mais leve, mais resistente, mais orgânica, mais simpática e de produção mais sustentável, à actual oferta do mercado. A exploração de novos polímeros e resinas, parece poder constituir uma oportunidade de êxito.
O estudo sobre a tipologia de usos e consequente indicador da forma dos objectos, deverá ter em atenção a vida comum dos potenciais utilizadores, numa perspectiva tão polivalente quanto possível. Não se deverá centrar apenas na ergonomia, mas tratar a percepção psíquica e social do objecto, convergindo num programa o mais polivalente e abrangente possível. O hibridismo funcional dos objectos poderá constituir grande vantagem na avaliação final do seu desempenho. Por exemplo, um carrinho de compras poderá resultar num andarilho dissimulado e assim cumprir a função de apoio à locomoção, evidenciando no entanto o aspecto de um carro de compras.
Deste estudo deverá resultar um conjunto excêntrico de potenciais argumentos de projecto, respondendo tanto a constrangimentos técnicos (por exemplo a dificuldade que doentes de artrose sofrem em produzir movimentos de rotação das articulações), como a necessidades psíquicas de representação social, ou condicionalismos produtivos. Da reunião dos mais diversos contributos de projecto em confronto com a recolha e classificação dos produtos existentes no mercado, deverá surgir um programa detalhado e síntese do conhecimento actual sobre a matéria.
Francisco Providência 3.01.09
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